Cerveja

A cerveja é uma bebida fermentada que, acredita-se, tenha sido a
primeira bebida alcoólica desenvolvida pelo homem. Uma cerveja é qualquer uma
das variedades de bebidas alcoólicas produzidas pela fermentação de matéria com
amido, derivada de grãos ou de outras fontes vegetais.
A fabricação da cerveja e de algumas outras bebidas alcoólicas é geralmente
chamada Cervejaria (Brewer). Historicamente, a cerveja era conhecida pelos
sumérios, egípcios e mesopotâmios, desde pelo menos 4.000 a.C. Devido aos
ingrediente usados para fazer cerveja diferirem de lugar para lugar, as
características (tipo, sabor e cor) variam amplamente.
Importantes fontes de informação, das quais se tem aprendido muito sobre as
maneiras e costumes de nossos ancestrais, são pinturas feitas por artistas há
muitos e muitos anos atrás. Para dar um exemplo, forma descobertas criptas
reais antigas no Egito, com paredes pintadas que mostram aspectos do dia-a-dia
na vida da comunidade com era há 3000 anos. Em uma das outras criptas a parede
pintada mostra etapa por etapa como a cerveja era produzida naqueles tempo,
através de pinturas feitas por artistas de aproximadamente 5000 anos.
Através dessa história aprende-se que os sumérios já tinham uma notável
indústria cervejeira. Estes cervejeiros preparavam a cerveja a partir de um
cereal que foi finalmente relatado como cevada. Eles foram os primeiros povos,
que se tem conhecimento, que controlou plantios em largas escalas. A bebida
alcoólica que eles preparavam, guardadas as devidas proporções, é basicamente a
mesma cerveja que produzimos hoje.
Pelos contatos que os sumérios tinham com seus vizinhos, eles acabaram
difundindo seus conhecimentos, primeiro para os assírios e os babilônios, e
através destes, aos egípcios, israelenses e outros.
Mais recentemente a cerveja tornou-se popular no oeste europeu, onde os
ingleses, os alemães, os holandeses e os belgas vivem hoje.
Em muitas outras partes do mundo, em especial nas regiões em que a cevada era
desconhecida, o consumo da cerveja deu-se tempos, porque ela tinha que ser
importada.
Desde o final do Século XIX cientistas têm imprimido um crescimento importante
no desenvolvimento da qualidade de cerveja. Estes desenvolvimentos têm sido
contínuos. Isso significa que podemos esperar mais progressos além de hoje.
Um resultado muito claro desses esforços combinados é que agora é possível
fabricar cerveja com uma constante alta qualidade, praticamente em qualquer
lugar do mundo.
Idade Média
A partir da Idade Média, os conventos assumiram a fabricação da cerveja
que, até então, era feita de forma doméstica. No século X, conforme documentos
encontrados num convento de St. Gallen, Suíça, os frades que produziam a
cerveja, recebiam 5 litros diários para o seu consumo pessoal. Foram os monges
que tornaram popular o uso de lúpulo como fator de amargor da cerveja. Neste
mesmo século, o Rei Ludwig da Baviera decretou uma lei favorecendo aos
conventos a fabricação de cerveja, e estabeleceu cotas para aristrocatas de
acordo com suas categorias hierárquicas.
Os conventos mais antigos que iniciaram a produção de cerveja foram os St.
Gallen, na Suíça, e os alemães Welhenstephan e St. Emmeran. Os beneditos de
Welhenstephan foram os primeiros a receber, oficialmente, a autorização
profissional para fabricação e venda da cerveja, em 1040 d.C. Com isso, esta é
a cervejaria mais antiga do mundo em funcionamento e é hoje, principalmente,
conhecida como o Centro de Ensino da Tecnologia de Cervejaria da Universidade
Técnica de Munique.Os povos do norte da Europa descobriram a técnica da
cervejaria não muito antes da era cristã. As primeiras bebidas celtas e
teutônicas feitas de uma mistura de milho e mel originaram o “hidromel” de sabor
ligeiramente ácido, o que levou ao desenvolvimento de fermentações lácticas. A
cerveja sempre foi consumida em países onde o clima e o solo eram inadequados
para a produção de vinho e de uva.
Origens
A origem das primeiras bebidas alcoólicas é incerta, mas provavelmente
tenham sido feitas de cevada, tâmaras, uvas ou mel, sendo a cerveja uma das
bebidas alcoólicas mais antigas do mundo. Mas, foram os gauleses os primeiros a
fabricá-la com malte, isto é, cevada germinada.
Há evidências de que a prática de cervejaria originou-se na região da
Mesopotâmia onde, como no Egito, a cevada cresce em estado selvagem. No Egito,
a cerveja ganhou status de bebida nacional, até com propriedades curativos,
especialmente contra picadas de escorpião. Consta que os egípcios gostavam
tanto da bebida que seus mortos eram enterrados com algumas jarras cheias de
cerveja.
Tem-se que a cerveja feita de cevada maltada já era fabricada na Mesopotâmia em
6000 a.C. No 4º ou 5º milênio a.C. já existiam diversos tipos de cerveja, sendo
que no Egito, aparentemente, a cerveja era bebida nacional e de grande consumo,
inclusive nos ritos religiosos, quando era ofertada ao povo.
Documentos históricos mostram que em 2100 a.C. também os sumérios, um dos povos
civilizados mais antigos, alegravam-se com uma bebida fermentada, obtida de
cereais. Na Suméria, cerca de 40% da produção dos cereais destinavam-se às
cervejarias chamadas “casas de cerveja”, mantidas por mulheres.
A cerveja é tão antiga quanto o pão, pois era obtida a partir da fermentação de
cereais como cevada e trigo. A cevada era feita por padeiros devido à natureza
da matéria-prima utilizada: grãos de cereais e leveduras. A cevada era deixada
de molho até germinar e, então, moída e grosseiramente moldada em bolos aos
quais se adicionava a levedura. Os bolos, após parcialmente assados e
desfeitos, eram colocados em jarras com água e deixados fermentar. Esta cerveja
rústica ainda é fabricada no Egito com o nom de Bouza.
O lúpulo, assim como outras ervas aromáticas, tais como o zimbro, hortelã e a
losna, podia ser adicionado à cerveja para corrigir as diferenças observadas no
sabor.
Há 15 séculos antes, um fragmento de cerâmica mesopotâmica, escrito em
sumérico-acadiano de 5000 a.C., dizia que fabricar cerveja era uma profissão
bem estabelecida e muito respeitada. Os gregos aprenderam a técnica da
cervejaria com os egípcios e também usavam lúpulo. Os romanos aprenderam com os
gregos e a introduziram na Gália e Espanha sem, contudo, usarem lúpulo até o
século VIII.
Os chineses foram os primeiros a preparar bebidas do tipo cerveja obtida de
grãos de cereais. A “Samshu”, fabricada a partir dos grãos de arroz, e a “Kin”
já eram produzidas cerca de 2300 a.C.
Em 500 a.C. e no período subseqüente, gregos e romanos davam preferência ao
vinho. A cerveja passou então a ser bebida das classes menos favorecidas, muito
apreciada em regiões sob domínio romano, principalmente pelos germanos e
gauleses. Foi nessa época que as palavras cevisia ou cerevisia passaram a ser
utilizadas pelos romanos, em homenagem Ceres, deusa da agricultura e da
fertilidade.
Você sabia que o professor Paul Haupt, da Universidade de Virgínia, em 1926
d.C., traduzindo uma tábua cuneiforme assíria encontrada nas ruínas de Nínive,
afirmou que parte do carregamento da “Arca de Noé” era cerveja?
Século XVI
Uma curiosidade é que a cerveja já era conhecida na América antes de
Colombo, que teria ganhado dos índios cerveja de milho. Entretanto, foram os
ingleses, em 1548, que introduziram a verdadeira cerveja.
Na Antiguidade usava-se para a elaboração da cerveja uma variedade imensa de
ingredientes para aromatizar o produto, como folhas de pinheiro, cerejas
silvestres e variadas ervas. Para regularizar o processo de fabricação da
cerveja, o Duque Guilherme IV da Baviera, decretou em 1516 d.C., a Lei da
Pureza. Essa lei, a mais antiga conhecida do mundo, determina que os
ingredientes que podem ser usados na fabricação de cerveja são: cevada, lúpulo
e água. A levedura de cerveja ainda não era conhecida e, somente mais tarde foi
incluída na lei.
Século XIX
Enquanto na Antiguidade o que caracterizava o processo de fabricação era
a experiência e a tradição, a partir do século XIX, o fabrico da cerveja pe
dominado pela ciência e pela técnica. Até o evento de Louis Pasteur, a
fermentação do mosto era natural o que, normalmente, trazia prejuízos aos
fabricantes. O notável cientistas francês convenceu os produtores a utilizarem
culturas selecionadas de leveduras para fermentação do mosto, para manter uma
padronização na qualidade da cerveja e impedir a formação de fermentação
acética. Pasteur descobriu que eram os microorganismos os responsáveis pela
deterioração do mosto e que poderiam estar no ar, na água e nos aparelhos,
sendo estranhos ao processo. Graças a esse princípio fundamental, limpeza e
higiene tornaram-se os mais altos mandamentos da cervejaria. O nome de Louis
Pasteur é lembrado através do termo “pasteurização”, método pelo qual os
microorganismos são inativados através do calor.
Outros dois grandes nomes estão ligados ao desenvolvimento da fabricação da
cerveja. Emil Christian Hansen e Carl Von Linde. O primeiro, em função do
desenvolvimento do microscópio, descobriu também células de levedura de baixa
fermentação, pois antes eram somente conhecidas leveduras de alta fermentação.
Ele isolou a célula, que foi multiplicada sob cultura pura. Como a levedura
influencia fundamentalmente o sabor, esta descoberta permitiu a constância do
sabor e da qualidade.
Carl Von Linde desenvolveu, através da compressão, a Teoria da Geração de Frio
Artificial com sua máquina frigorífica a base de amônia. Com isso, a produção
de cerveja pôde, desde então, ser feita em qualquer época do ano, sendo
possível controlar os processo de fermentação de forma científica exata, pelo
entendimento da atividade dos microorganismos e reconhecimento de que diversas
leveduras, por exemplo, atuam diferentemente e de que as condições do meio
afetam de maneira básica a ação de uma mesma cepa.
Com a evolução da técnica industrial, as cervejarias passaram da fase empírica
para a científica. O “Mestre Cervejeiro” conta com todos os recursos técnicos e
sanitários para a elaboração de um produto tecnicamente perfeito. Um cervejeiro
moderno deve ser um engenheiro, químico ou bacteriologista.
No Brasil, a cerveja demorou a chegar, pois os portugueses temiam perder
o filão da venda de seus vinhos. O hábito de beber cerveja começou nos tempos
de D. João VI, época em que a Colônia Inglesa importava a bebida da Europa e,
até o final do século passado, o Brasil ainda importava a bebida.
As primeiras indústrias brasileiras surgiram na época da Proclamação da
República, em 1889. Essas cervejas nacionais tinham um grau de fermentação tão
alto que, mesmo depois de engarrafadas, produziam uma enorme quantidade de gás
carbônico, criando grande pressão.
As primeiras marcas nacionais foram a Logos, Guarda Velha e Gabel. Um pouco
mais tarde surgiram as marcas Vesosso, Stampa, Olinda, Leal e Rosa, todas de
curta duração.
Destino bem diferente teria a “Manufatura de Cerveja” do suíço Joseph Villiger,
fundada em 1888, no Rio de Janeiro, portanto, muito antes das demais.
Inconformado com a má qualidade das cervejas até então fabricadas no Brasil,
ele decidiu abrir uma cervejaria em sua própria casa. Sua fórmula fez muito
sucesso e, a cada dia, sua casa estava mais cheia de amigos que queriam beber o
novo produto.
Estimam-se que existam cerca de 20.000 diferentes tipos de cerveja no
mundo. Vejamos alguns:
Ales Belgas Trappist:É uma Ale Belga que começou a ser produzida por monges
trapistas em abadias belgas e holandesas. É forte e frutada, se comparada aos
vinhos, seria como um bom Porto. Bebe-se na temperatura ambiente.
Ale Bitter: De cor de cobre, é encorpada, tem sabor de malte e de lúpulo
bem balanceado.
Altbier: É uma ale tradicional da região de Dusseldorf, tem corpo bem
balanceado, sabor limpo e delicado. Servida abaixo de 10 graus.
Brown Ale Scotch Ale: De cor pronunciada, encorpada e com sabor de malte. Muito
semelhante à Bitter Inglesa.
Bock: Escura e forte, de baixa fermentação.
Doppelbock: Muito adocicada e suave, de alto teor alcoólico.
Dortmunder: Uma variação da Pilsen produzida na Alemanha. Tem uma sensação de
amargor acentuado e mais picante na língua do que as Pilsens em geral.
Gueze, Lambic, Framboise: Seu processo de fermentação diferenciado, o mosto é
exposto à contaminação atmosférica, contrário a tecnologia conhecida para se
fabricar cerveja. Na Bélgica serve-se como aperitivo de boas vindas.
Kolsh: Cerveja tradicional da cidade de Colonia. Difere da Altbier pelo seu
paladar suave e refrescante. É servida a 5°C.
Lager Americana: A cerveja americana era uma versão Pilsner, muito leve, quase
sem lúpulo e praticamente sem sabor. Denominou-se Standard Lager Americana.
Lager Brasileira: Muito semelhante à Lager Americana. Com mais lúpulo e fazendo
bastante uso de como adjuntos milho e arroz, muito próxima das cervejas
escandinavas
Lager Pilsen ou Pilsner: Originária da cidade de Pilsen na Boêmia, na República
Tcheca. Muitas cervejas aproximam-se da Pilsner porém muito menos encorpadas e
atenuadas em sabor se comparadas às originais, devido à utilização de milho e
arroz. Na Boêmia e na Alemanha continua-se a produção de Pilsen com puro malte
sem o uso dos adjuntos.
Munchener: Na Bavária produzia-se uma cerveja de baixa fermentação porém de
coloração escura e com um leve paladar picante de malte e café. Este tipo foi
chamado de Dark-lager. Hoje produz-se em Munique várias lagers claras porém
mantendo o sabor acentuado de malte das suas origens.
Helle: Derivada da Munchener de cor clara. É parecida com a Pilsner porém com
um sabor mais acentuado de malte.
Pale Ale: É uma Bitter engarrafada, com um nível mais elevado de carbonação.
Porter: Originária da Londres dos séculos 18 e 19. Feita com cevada torrada não
maltada e grandes quantidades de lúpulo. É uma cerveja preta extremamente
amarga e com bastante espuma. Servida a 13 graus, normalmente consumida com
frutos do mar.
Stout: Similares às Porters. As Stouts inglesas são geralmente adocicadas, já
as Stouts irlandesas são secas, amargas, intensas e com um sabor de café
queimado. São melhores na temperatura ambiente.
Vienna, Marzen, Oktoberfest: De cor avermelhada proveniente de Viena que
inspirou os alemães a produzir a Marzen. Na Alemanha é produzida para consumo
nos tradicionais BierGarten, que no mês de outubro, ganha o nome de
Oktoberfest.
Weizenbier: Cerveja branca ou feita com trigo. ácida, muitas vezes opaca e não
filtrada. É uma cerveja típica de verão.
Wheat Berliner Weisse: Produz uma espuma densa e efêmera, desaparecendo tão
logo é servida. Possui baixo teor alcoólico, é altamente refrescante e de
paladar ácido.
Gastronomia
Não importa em que idioma se levante
um brinde, desde que seja regado pela mais saborosa cerveja, que pode ser
alemã, brasileira, belga ou irlandesa. O universo cultural da “cerva”,
sabiamente apelidada pelos gregos de “néctar da vida”, ganha mérito nas
palavras do especialista no assunto, Xavier Depuydt Cynthia Pastor.
Com um sotaque pra lá de divertido, o simpático e notório mestre em cervejas,o
belga, Xavier Depuydt, radicado no Brasil desde 1996, é dono no Rio de Janeiro
da cultuada Belgian Paradise, um misto de cervejaria e loja. Em entrevista
exclusiva para o Jornal da Comunidade, Depuydt mostra o caminho das pedras das
cervejas importadas e ensina que as nuances etílicas da “loura” são mais
diferenciadas do que julga nossa vã filosofia cervejística. Confira!
Depuydt, você ficou muito famoso depois de deixar o apresentador Jô Soares meio
tonto em uma degustação de cervejas?É… (risos) em embebedei ele só um
pouquinho.
Quando você chegou ao Brasil?Cheguei em 96 e em 97 comecei imediatamente a
importar cervejas. A Duvel belga foi a primeira que importei e depois outros
rótulos. A grande vantagem que eu tive em toda essa história foi começar com
cervejas caras, porque ficou mais fácil baixar os preços depois. Se você começa
com uma cerveja barata é muito difícil aumentar os preços.
Você fala da questão qualidade-preço de uma cerveja como a belga Stella Artois,
muito consumida na Europa. Aqui no Brasil, sabor e valor combinam?Hoje só tenho
algumas que são mais caras, outras já têm o preço bem básico. Quanto ao sabor,
não existe cerveja ruim, mas cervejas que não são adequadas ao paladar de cada
pessoa. Se você pegar 10 pessoas que gostem de Brahma e que nunca tomaram uma
outra cerveja na vida e oferece uma Stella Artois já vai ser diferente. Tudo
depende da evolução do paladar. A evolução passa pelas importadas como a
cerveja Deus, por exemplo, ou então a pessoa fica parada no que já conhece.
Temos ainda as alemãs que são mais amargas, contudo, a maioria das pessoas
confundem amargor com sabor. Pilsen não tem sabor, Pilsen tem amargor. Um
exemplo é a Stella Artois, que é fabricada no Brasil hoje, onde baixaram 10% no
amargor porque os brasileiros não gostam do amargor, mas os ingredientes
importados são os mesmos.
Quais são as cervejas mais tradicionais na Europa?Lá temos vários parâmetros. O
país que bebe mais cerveja do mundo é a Tchecolosváquia, que consome 150 litros
per capita. No Brasil acho que são só 54 litros por pessoa, dependendo do poder
aquisitivo. Na Bélgica a gente consome em média 98 litros por pessoa por ano,
mas a Bélgica na regra é uma exceção, porque lá 67% são cervejas pilsener,
então se você calcular o percentual em relação a outros países vai ver que os
belgas são os maiores bebedores de cervejas fortes e encorpadas. Hoje temos por
lá quase 800 marcas e 658 tipos de cervejas. O que é impressionante para um
país pequeno. Na Alemanha por exemplo, existem três mil cervejarias, onde eles
fabricam as mesmas cervejas: Weiss Beer, Pilsener, Bock, Double Bock e só,
acabou.
Então acreditar culturalmente que os alemães e os ingleses é que são os bons
bebedores é um erro?Ainda há muito desconhecido sobre a cultura da cerveja.
Dizer também que os alemãe têm a melhor cerveja não tem nada a ver. Um dos
grandes críticos da cervejaria, o inglês Michael Jackson (não é o cantor, por
favor! Risos), diz que com tantos tipos ele nunca tomou uma cerveja igual a
outra. A Duvel, nascida nos anos 70, é um exemplo de cerveja de sucesso e todo
mundo começou a copiar o contexto relacionado ao nome. E ninguém precisa fazer
uma cerveja igual e com nome igual também. Na Bélgica fazemos degustações de
vários tipos, com vários produtores em uma cervejaria. Já aqui no Brasil todo
mundo é concorrente. Lá na Bélgica ninguém concorre, muito embora não se conte
o segredo de sua cerveja, tudo é discutido em conjunto com as exportações, como
andam os sabores, ou seja, se questiona a qualidade das cervejas produzidas e
que não são iguais. Um exemplo de diferenciação essencial do produto são as
cervejas carmelitas fabricadas no mosteiros belgas.
Cerveja tem terroir? É igualzinho ao vinho. Os cervejeiros, por exemplo,
compram o lúpulo de uma região e o grão para gazer uma cerveja, se no período
tinha mais chuva o sabor da cerveja será certamente diferente. Mas eles
controlam os sabores e fabricam as cervejas em tanques e criam uma certa
padronização que é adotada pelas grandes cervejarias por aqui. Já as pequenas
cervejarias no Brasil não têm fabricação suficiente, elas produzem um tanque de
1,5 mil litros por vez. Na próxima fabricação, se houver um atraso do malte que
vem da Inglaterra, e se este estiver diferenciado em sabor por causa das chuvas
e do solo, o produtor já vai fazer uma cerveja com sabor que não é igual. E às
vezes a diferença é muito grande.
Existem cerveja importadas que são fabricadas como alguns vinhos, com certas
regras e numa só época do ano?Sim. Um exemplo é a Gouden-Carolus, que é
fabricada só no dia 24 de fevereiro, que é o aniversário do imperador Carlos V.
Como são diferenciadas as imponentes marcas das plebéias?O preço da cerveja é
feito pela raridade do produto. Na Bélgica temos, por exemplo, as Trappist
Beer, produzidas em mosteiros na Europa. É um produto que vem com uma
identificação de autenticação, é como se fosse um produto de origem controlada
para os próprios mosteiros fabricantes da Trappist na Alemanha, Holanda,
Bélgica, que controlam a marca. Essa cerveja é vendida na porta dos mosteiros.
Os padres só a fabricam quando precisam de dinheiro para sustentar a irmandade,
imagina que felicidade! (risos). A raridade é que conta. Daí eu pensei, eu
preciso ter essa cerveja no Brasil. Pedi para uma amiga comprar uma caixinha de
cada vez. Em sete meses acumulamos 30 caixas. Aqui no Brasil cada garrafa está
saindo a R$ 50. Agora, a melhor cerveja não existe, pois depende unicamente do
seu paladar. Uns vão falar que a Brahma é a melhor, outra que a Stella Artois é
a melhor e por aí vai. Eu tenho uma lista de 20 preferidas. E você não imagina
como é um mundo complexo.
Existem cervejas de guarda, como no caso do vinho?Eu tenho uma adega de
cervejas. Tenho cervejas de 1999, desde quando comecei a colecionar. Montei
essa adega dentro de um balcão que tem uma temperatura constante de 18 graus.
E no que tange a degustação. Como funciona?Existe um copo próprio para
degustação de cervejas. A Universidade de Louvain, na Bélgica, fez um estudo
sobre o copo ideal e concluíram que a tulipa é a melhor para degustação da
cerveja. A tulipa guarda a espuma por mais tempo e se você girar o copo a
espuma volta e os aromas também.
Degustação é olho, nariz e boca. O primeiro ato sensorial que vai para o
inconsciente é a cor da cerveja, depois os aromas. Nesse ponto a pessoa já tem
75% de uma idéia da cerveja que vai beber. Aí quando prova, vem a surpresa ou a
decepção. Uma vez fizemos uma degustação no restaurante Leopoldo com dois chefs
renomados que disseram que não imaginavam que a cerveja pudesse combinar com
sobremesas,por exemplo. Outra vez, fizemos uma degustação de queijos com vinho
e com cervejas e aí vimos que no caso do vinho com queijos o sabor de um dos
dois domina, já no caso da cerveja, ela combina muito bem com qualquer queijo.
Então, dando continuidade à harmonização com a gastronomia, o que você sugere?A
harmonização da cerveja funciona basicamente assim: cerveja leve combina bem
com comida leve e cerveja forte e encorpada com carnes e molhos fortes. Por
exemplo, um mexilhão vai muito bem com uma boa cerveja de trigo ou com
Pilsener. Outra boa pedida é cerveja Blanche com chocolate belga em sima ou
Rochefort 8 que combina perfeitamente. Uma carne como a Carbonada de Boeuf, por
exemplo, é feita à base de cerveja, mas independente de ser feita com a bebida,
o molho é muito denso e você deve então beber uma cerveja mais encorpada.
E a regra da regionalização se aplica à cerveja?Sim, com certeza. Qualquer
restaurante como um mínimo de especialização em cervejas lá na Europa te traz o
prato com uma cerveja junto. Lá você pode escolher pelo menos 650 tipos.
E sobre a importação e a exportação das brasileiras?Hoje temos sete ou oito
importadores de cerveja. Tudo começou com a Duvel e hoje você já encontra boas
marcas até mesmo em supermercados. Em relação à exportação, é preciso que se
entenda que a Brahma que vai para a Europa não é a Brahma daqui. Ela é
fabricada numa cervejaria da Amblev lá pela Europa e o lúpulo foi trocado,
assim como o tipo de cevada para atender ao gosto daquele mercado, ou seja, o
sabor é adequado para o consumidor específico. Outra coisa, aqui a cerveja tem
conservantes, lá não. Se você bebe uma cerveja daqui na praia, num calor de 40
graus, tudo fica bem, mas se você bebe uma Stella Artois por exemplo na mesma
situação você cai, porque a Stella tem um teor alcoólico muito mais alto e
adaptado para o gosto europeu. Agora eu desafio que se coloque todas as marcas
de cervejas brasileiras atuais juntas em uma degustação e que ninguém consiga
identificar uma diferença forte entre elas. O sabor neutro infelizmente está
muito padronizado e é triste admitir que essa é uma tendência mundial porque se
tem a ambição de produzir muito. Você acha, por exemplo, que Mc Donald’s é bom
ou tudo tem o mesmo gosto? Nós precisamos da imprensa para divulgar as
variedades da cerveja, porque cerveja não é Coca-Cola.